Coimbra
"in" as beiras
O senhor primeiro-ministro e os
seus antecessores têm procurado
convencer os portugueses que são
responsáveis pelo pagamento da dívida
soberana, quando na realidade
os cidadãos portugueses têm tanto a
ver com a dívida do Estado quanto o
Estado tem a ver com as suas dívidas,
ou seja, nada.
O desequilíbrio orçamental tem
sido o pretexto para onerar quem
trabalha em Portugal.
Os cortes nos salários violam a
proibição da redução remuneratória
consagrada na alínea d) do art. 89º
do Regime de Contrato de Trabalho
em Funções públicas, que, por ser
uma lei de bases tem valor reforçado
e no artigo 129.º 1. d) do Código do
Trabalho quanto ao sector privado .
Pretender descontar 10% nas pensões
de aposentação da Caixa Geral
de Aposentações com efeito retroactivo,
com o argumento da convergência
com o sistema de reforma
da segurança social é algo que tem
tanto de absurdo quanto de ilegal,
por violar direitos adquiridos, equiparados
ao direito de propriedade.
Ou será que o senhor primeiro-ministro
pensa devolver aos lesados
10% dos descontos que efectuaram
ao longo de toda a sua vida activa ?
Os portugueses têm sido chamados
a comparticipar no deficit, mas
ninguém os chama a partilhar do
superavit das empresas públicas
rentáveis .
As pensões de reforma ou de aposentação
são calculadas segundo
critérios pré-determinados unilateralmente
, sem que os beneficiários
tenham sido ouvidos nem achados.
Se mesmo assim tais critérios não são
cumpridos, estamos perante algo
intolerável e chocante, pois atenta
contra um dos principais pilares do
Estado de Direito Democrático que
é o do princípio da confiança .
Se eu
fosse primeiro-ministro nunca daria
o aval do Governo a uma tese, como
a sustentada pelo Tribunal Constitucional
no Acórdão 396/2001,
que faz dos trabalhadores do sector
público filhos de um Deus menor,
ao considerar que por receberem «por verbas públicas» estão sujeitos
a um “sacrifício adicional”, tendo
assim inventado um novo ónus para
os trabalhadores do sector público,
tal como inventou a inconstitucionalidade
a prazo a propósito da
suspensão dos subsídios de férias e
de Natal, o que equivale a afirmar:
é ilegal, mas poderá continuar a ser
cometida a ilegalidade até ao final
de 2012 .
Se for confirmada em última instância
aquela tese do Tribunal Constitucional
nos processos em curso
nos tribunais administrativos, apesar
de já ter sido reconhecida pelos Tribunais
de Loulé e Porto a inconstitucionalidade
das normas orçamentais
que consagram a redução remuneratória,
levarei o caso ao Tribunal
Europeu dos Direitos do Homem, invocando
a violação do direito “a que
a causa seja examinada, equitativa e
publicamente, num prazo razoável
por um tribunal… imparcial”, consagrado
no artigo 6º da Convenção Europeia
dos Direitos do Homem.
Aos
credores internacionais e à Troika
falta também legitimidade jurídica e
moral para a imposição de cortes nos
vencimentos e pensões aos cidadãos
dos Estados sob resgate, assistindo-lhes
sim o direito de dar à penhora
bens dos Estados devedores. (...)
Castanheira Barros
Advogado